A questão agrária como uma questão ecológica na América Latina

Chamada de artigos para número temática de Latin American Perspectives

Editores: Daniela Garcia Grandon, Joana Salém Vasconcelos and Andrew R. Smolski

Os sistemas agroalimentares do século XXI na América Latina enfrentam uma grande quantidade de desafios sociais interconectados, que se derivam da hegemonia política e econômica do capitalismo global. Os problemas mais prementes são a centralização da propriedade das grandes corporações do agronegócio, o deslocamento de comunidades indígenas e camponesas de seus territórios, a financeirização da economia agrária, a exploração do proletariado rural e dos agricultores por contrato e a aparição de uma “granja mundial”, cujas decisões de produção dependem das cadeias globais de valor. As transformações das relações sociais de produção conduziram a precarização e feminização do trabalho rural, a urbanização e proletarização das comunidades camponesas, a cadeias de abastecimento alimentares longas e obscuras e ao deterioramento alarmante nas dietas e nutrição, inclusive considerando os aumentos da produtividade agrícola.

Os estudos críticos destas tendências argumentam que elas produzem desafios também ecológicos e que se somam aos problemas das práticas agrícolas da Revolução Verde. Durante o século XX, para difundir o modelo econômico do Norte Global, tais práticas privilegiaram a maquinaria pesada, fertilizantes sintéticos, monoculturas, híbridos de alto rendimento e controle químico de pragas e patógenos. No século XXI, se agregou a estas práticas a modificação genética de cultivos e de gado, bem como a automatização da maquinaria através de tratores guiados por GPS, convertendo a agricultura cada vez mais em laboratórios de produção tecnificada e armazenamento em larga escala. No caso dos organismos geneticamente modificados (OGM), se usam intensamente em controles químicos, já que os cultivares se modificam para que sejam resistentes aos herbicidas produzidos por companhias agroquímicas transnacionais, como Monsanto-Bayer, Syngenta, BASF, Dow Chemical e DuPont. Tais combinações de pesticidas e OGM levaram ao desfolhamento e, apesar das afirmações iniciais do contrário, um aumento das aplicações de pesticidas. Em geral, as práticas agrícolas da Revolução Verde conduziram a um aumento das emissões de carbono, tanto pelo carbono liberado na aragem do solo ou na derrubada de uma floresta, como pela dependência da gasolina para as maquinarias. Também levou a uma sobreacumulação de nitrogênio e fósforo, à redução da biodiversidade, à degradação do solo e à contaminação de fontes vitais de água. Portanto, se enfrenta um sistema materialmente incapaz de uma reprodução saudável no longo prazo, em nível ecológico e social.

Com as consequências ecologicamente destrutivas da agricultura intensiva capitalista e os desafios dos movimentos sociais rurais, as análises da questão agrária no século XXI se inclinam cada vez mais para uma perspectiva ecológica. Como tal, os acadêmicos começaram a reavaliar o papel da ecologia na questão agrária, considerando a diversidade sociocultural, político-econômica, geográfica, biológica e nas cosmovisões da América Latina. Nesse chamado, solicitamos artigos que busquem responder as seguintes perguntas gerais: (1) De que maneira a centralidade da ecologia para a questão agrária no século XXI altera os enquadramentos dos problemas e soluções relacionadas com os agrossistemas latino-americanos? (2) Que projetos de resistência surgiram contra o dano ecológico causado pelo capitalismo agrário e quais são suas formas de luta e organização? (3) Quais são os desafios técnicos, científicos e políticos para as transições agroecológicas na América Latina?

Estamos interessados em evitar reduções de classe ou produtivismo, buscando sínteses com marcos interseccionais e decoloniais. Queremos incluir no diálogo os giros ecofeminista, ecoterritorial, ecoanarquista, bem como as contribuições do marxismo heterodoxo comunitário. Ademais, a mudança nas posições políticas do produtivismo à ecologia, da centralidade do Estado à centralidade dos territórios, das coalisões proletárias às coalisões de diversas classes sociais, todas as quais representam dinâmicas importantes na democracia participativa que surgiram da constante experimentação durante os séculos XX e XXI contra o domínio (neo)colonial do capitalismo, da supremacia branca e do patriarcado.

Junto destes parâmetros contemporâneos das ciências sociais, também estamos interessados em uma perspectiva agroecológica, enfatizando temas como o controle biológico e físico de pragas e patógenos, a acumulação de matéria orgânica no solo, cultivos intercalados e agricultura integrada, captação de água e biodiversidade em todo o agroecossistema. Considerando que LAP não é uma revista de Ciências Naturais, os artigos devem buscar enfocar-se nas relações sociais que unem o nexo ecológico. Podem ser enviados em inglês, espanhol ou português, e podem abordar, entre outros, os seguintes tópicos:

  • Artigos que explorem o capitalismo agrícola sob os governos neoliberais e/ou neodesenvolvimentista da América Latina, considerando o extrativismo e o neoextrativismo dentro do marco agrário, a relação entre as corporações agrícolas transnacionais, o Estado e as instituições globais.
  • Artigos que analisem os sistemas agroalimentares, considerando as relações entre produção, consumo, seus trabalhadores formais e informais, suas cadeias econômicas e seus significados socioecológicos.
  • Artigos que explorem a relação entre soberania alimentar e a ecologia da América Latina, sua conceitualização e história, suas relações com movimentos indígenas e camponeses e com as lutas anticoloniais.
  • Artigos que examinem a história e os problemas sociais dos trabalhadores rurais, incluída sua urbanização e as tensões político-culturais entre trabalhadores urbanos e rurais. Ademais, que explorem o papel e as implicações para os trabalhadores assalariados rurais e/ou sem-terra, seus movimentos e interesses, as condições laborais, a feminização, a capacidade organizativa e sua relação com as organizações ambientais, camponesas e indígenas.
  • Artigos que analisem os desafios e contradições das transições agroecológicas, examinando políticas e desenvolvimentos na América Latina, por exemplo, desde os territórios zapatistas que proíbem pesticidas até o sistema da milpa Maia, desde as cooperativas agroecológicas camponesas em Cuba até as realidades agrárias do sumak kawsay e bem viver.
  • Artigos que examinem as doenças relacionadas com a provisão de alimentos e os vínculos com as transições sociais de dietas compostas de alimentos de origem, cultivo e criação locais, crus ou minimamente processados a alimentos processados industrialmente, considerando a relação de interesses entre os sistemas de saúde, as indústrias farmacêuticas e os do agrocapitalismo.
  • Artigos que analisem as estratégias educacionais e culturais que (re)colonizam ou descolonizam os paradigmas produtivos e as práticas de consumo, considerando a revolução verde versus o caminho agroecológico.
  • Artigos que abram diálogo epistemológicos e ontológicos com diversos territórios para descolonizar as práticas agrícolas em termos culturais, sociais e técnicos.
  • Artigos que se enfoquem em como as organizações marxistas e anarquistas usam a ecologia para abordar a questão agrária, bem como seus programas e desenvolvimentos.

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Para evitar duplicação de conteúdo, sugerimos que os autores entrem em contato com os editores para informar do seu interesse em enviar um artigo e o tema que querem desenvolver. Os artigos devem ser submetidos o mais brevemente possível, de preferência até 1º de agosto 2022, porém esta chamada de artigos permanecerá aberta enquanto estiver postada no site da LAP.

Os manuscritos devem ter no máximo 8,000 palavras, incluindo notas e referências. Espaço duplo, com fonte Times New Roman 12, margens de 1 polegada e paginados. Devem conter um resumo de no máximo 100 palavras, cinco palavras-chave e uma folha de rosto separada, com identificação do autor, filiação e informações de contato, incluindo e-mail e endereço postal.

avor seguir o guia de estilo disponível em www.latinamericanperspectives.com na seção Calls for Manuscripts onde os detalhes sobre o processo de avaliação dos manuscritos são encontrados. Os autores também devem ler sobre a política editorial da revista na seção “About” do guia.

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Os manuscritos submetidos devem ser originais que não foram publicados em inglês e que não estejam sendo submetidos ou considerados para publicação em forma idêntica ou similar, em outras revistas.

A submissão de artigos deve ser feita diretamente através da secretaria da revista, em formato Word doc para: lap@ucr.edu. Coloque seu nome na linha “assunto”, como a seguir – “Seu nome – MS for the questão agrária issue”. Porém, em caso de dúvida ou necessidade de maiores esclarecimentos sobre este número especial, por favor entre em contato com os editores:


Joana Salém – joana.salem@gmail.com